Por Elizeu Cardoso
Desde que vi a nova regionalização do Maranhão que fiquei mudo. Perdi a fala, feito criança amuada, e ando meio empacado, não vou mentir, burro brabo que pode é apanhar, mas não arreda o pé.
Estava todo mundo lá na Baixada, povo de riso fácil e
histórias de nunca acabar, e alguém teve a descabida ideia. Homens fechados em
salas de vidro e ar modificado, com caneta e lápis, notebook, smartphone e gps,
decidiram: A Baixada é muito grande, vamos subdividir!
De uma canetada levaram Alcântara, Bequimão,
Bacurituba e Cajapió, para um tal “Litoral”, ao lado de Mirinzal, Central do
Maranhão, Guimarães, Cururupu, Cedral, Porto Rico, Serrano do Maranhão, Bacuri
e Apicum-Açu.
São meio tanso, né? Pensam que só porque uns têm rios
e outros têm mar, o sal há de nos separar. Deixem de bobagens, doutores! O que
nos une, eu nem queria, mas vou elencar:
– É a curacanga, bola de fogo que anda por tudo quanto
é lugar. Nesse pedaço de terra todo mundo já viu, até as crianças que acabam de
nascer, é só perguntar.
– É a travessia no ferry-boat. Quando a gente deixa a
cidade grande e ri até com o vento, assim que avista o Cujupe, vem tudo no
pensamento.
– É o quintal cheio de fruta, o poço e a cerca velha.
Na mesa da cozinha duas comidas sagradas: Na hora do almoço e do jantar a
farinha de mandioca, e no meio da tarde, todo mundo reunido tomando café preto
e um bolo de tapioca.
– É a conversa na boca da noite, a rua é o quintal da
gente. Os vizinhos são tudo irmão, os mais velhos tudo tios, e se ficar magro é
doença, porque lá ninguém tem fastio. É manga, milho, abacate, araticum,
jenipapo, bagre, tapiaca, muçum, caranguejo, camarão, sururu, acará, piaba e
traíra.
Deixem como estava, sei dessa ciência um pouquinho. A
Geografia é mãe, desde os gregos, que sempre acha um jeitinho. Já ouviram falar
da velha que olhou a foto da neta e disse: Benzadeus, retrato é coisa que
parece! Do outro que só andava em linha reta na sua bicicleta? Bastava chegar
num canto que descia, para arrumar a direção? Do casal que criou um sapo como
se fosse um filho? Do pistoleiro que acabou uma festa fazendo o som de tiro com
a boca? De Dom Sebastião e seus cachorros andando na noite escura? Do vendedor
de ovos que comprava e revendia pelo mesmo valor, apenas porque o trabalho
enobrece o homem? Tudo coisas de lá.
Essas coisas não cabem em mapas, senhores, porque são
cartografias das falas, dos risos, das memórias, dos cheiros, das cantorias,
dos tambores e das festanças. A Baixada não cabe nem nela mesma, repare bem
como a gente a leva para tudo quanto é lugar. Mas se ainda assim tiverem dúvida
do que vos alerto e protesto, mandem uma pessoa dessas, de qualquer lugar
falar. Bastará abrir a boca que vai sair de uma vez, pois por mais que falemos
português, é a alma que determina, o nosso sotaque é baixadês!
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