Dando sequência às postagens que faremos
toda esta semana sobre São João BatiDando sequência às postagens que faremos
toda esta semana sobre São João Batista e sua história, publico hoje uma crônica
que integra o nosso livro de crônicas que estamos produzindo e que deverá ser
publicado em breve. Ela trata sobre o Porto da Raposa. Um espaço responsável,
no viés economia, pela emancipação de São João Batista. Os fatos aqui
mencionados são só um recorte das muitas histórias vividas naquele lugar. Nos
dias que se seguem haveremos de falar do poder legislativo e das nossas
primeiras normalistas entre outros assuntos. Para hoje o texto é: O velho porto da Raposa.
é: O velho porto da Raposa.
O VELHO PORTO DA
RAPOSA
Não sei ao certo quando surgiu o
Porto da Raposa. Quando me entendi, ele já existia. Mas só vim conhecê-lo de
fato quando vim para a cidade pela primeira vez. Tinha que se passar por ali.
Era lá o embarque nas lanchas que nos trazia até a capital.
Encravado às margens de extenso
Igarapé que rasga continente adentro, o antigo Porto da Raposa ficava no
povoado campestre de mesmo nome, a poucos quilômetros do Golfão Maranhense
(Baia de São Marcos) e do estuário do Rio Mearim. De um lado uma extensa
cortina verde formada por manguezais, de outro, mais para dentro do continente,
extensas áreas de campos e tesos.
Ao longo de muitas décadas foi a
única porta de entrada e saída de muitos municípios da baixada, especialmente
São João Batista, São Vicente Férrer, Matinha, entre outros. Estamos falando de
mais de meio século. Naquele tempo não havia estradas que ligassem estes
municípios à Capital do Estado. O porto cumpria assim então a sua primordial
finalidade. Era ponto de escoamento de mercadorias que iam e vinham e de
embarque de passageiros que se destinavam rumo a São Luís e vice-versa.
Ainda lembro vagamente de algumas
particularidades daquele lugar. Eram dois os principais atracadouros,
exatamente para duas lanchas que costumavam fazer o transportes de cargas e
passageiros. Eram dois pares de extensas passarelas, construídas de achas e mourões
de mangue que nos levavam até ou a parte baixa, ou à parte alta da lancha, o
convés, onde ficava o timoneiro, ou mestre, e onde ficavam os passageiros.
Às vezes três ou mais lanchas ancoravam
por ali. Todas bem nomeadas. Maria do
Rosário. Santa Teresa, esta, pequenina e valente, boa de navegação. A Proteção
de São José, que sucumbiu na maior tragédia náutica ocorrida naquela travessia.
A Ribamar. A Fátima. A Nova Estrela e a Imperatriz foram as últimas dos tempos
auge do transporte marítimo. Nestas últimas fiz a maioria das minhas viagens.
A Raposa era um lugar como muitos
outros numa área de campo. As casas de jirau, mostravam que ali em épocas de
inverno costumava ser úmido e encharcado. Eram habitações de madeiras, desde o
assoalho até as paredes. As cobertas, algumas eram de telhas de barro, outras
de pindobas. Naqueles tempos de plena atividade do velho porto, Raposa devia
ter umas cinquenta casas. A maioria eram de pessoas que viviam em função do
porto. Pequenos comerciantes, estivadores, donos de pequenas embarcações e até
mesmo ambulantes que viviam da compra e venda de mercadorias e produtos. Eram
todos hospitaleiros. Lembro de Seu Dominguinhos, sempre cortês, atencioso, mas,
dizem os que mais o conheciam, de uma astúcia e malícia sem precedentes.
Entre as muitas peripécias
atribuídas a Seu Dominguinhos está a de ter dado um pernoite ao Padre Dante que
certa vez se deparou numa noite escura e não quisera voltar pra sede. Fora
aconselhado a ficar por ali. Após acomodar o Padre em uma rede, contam que Seu
Dominguinhos acendeu uma fogueira de pau de siriba, uma espécie de mangue que
ao queimar expele uma fumaça ardente aos olhos de qualquer cristão, ainda mais
a quem não era acostumado, como o sacerdote italiano. Contam que o Padre passou
a noite em claro, rezando para que logo amanhecesse, enquanto Dominguinhos se
contorcia de risos. Ao amanhecer os olhos do reverendo pareciam duas bolas de
sangue.
As principais casas de comércio e
pequenos restaurantes estavam ali em redor do armazém. Um velho prédio de
alvenaria que servia como uma espécie de alfândega. Era lá que trabalhavam os
fiscais da receita estadual. Ali eram expedidas e pagas as guias de impostos
sobre o que era embarcado, fossem cofos de farinha, cofos de banana, cofos de
criações, pequenos e grandes animais. Quase nada passava sem as vistas dos
coletores de impostos. Nos dias de embarque e desembarque era bastante intenso
o movimento de pessoas por ali. Fossem os que viajavam, os que ali trabalhavam,
e os que apenas buscavam estar no meio do vai e vem das pessoas. Não faltavam
também os donos de bancas de jogo de caipira. Mas era uma alegria só. O povoado
era tão movimentado que ganhou até um gerador de luz para garantir a
permanência das pessoas que por ali transitavam e trabalhavam até o zarpar das
lanchas.
Nos dias que não se tinha esse
movimento proporcionado pelas lanchas, o povoado de Raposa mantinha um
quotidiano normal. Moradores em suas tarefas diárias preparavam-se para o dia
seguinte. O incremento maior do porto fora sem dúvida quando da construção da
“barragem da Raposa”. Esta grandiosa obra - tanto pela extensão como na forma
de como fora construída, realizada pelo então prefeito Luiz Figueiredo -
permitiu um tráfego maior de veículos por mais tempo ao longo do ano.
A partir da abertura da Estrada
da Beta, nome que fora dado inicialmente pela população para o ramal São João
Batista – Bom Viver, que ligou a sede do município à MA -014, começaram ainda
que com muitas dificuldades por conta das condições da estrada, os transportes
de cargas e passageiros por via terrestre, fato este que atingiu frontalmente o
cerne da economia gerada no Porto de Raposa por conta do transporte marítimo.
Os primeiros ônibus a fazerem linha para São João Batista e até mesmo para outros
municípios da Baixada foram os da Expresso Florêncio, que inúmeras vezes não
completavam o trajeto da viagem.
Hoje, com poucas casas e sem
aquele fervilhar de pessoas que faziam dali um marco da economia do município,
o Porto da Raposa precisa se redescobrir com um outro propósito. A rodovia nos
leva até a capital São Luís, ou a terras além do estado.
Sempre defendi que o antigo e
outrora próspero Porto da Raposa deveria absorver em tempos atuais outras
finalidades. Ao que parece, por obra e graça do tempo e pela resistência de
alguns poucos moradores que ali ainda residem, esta é uma realidade próxima das
novas gerações. Por conta de sua aprazibilidade e beleza natural, o velho Porto
de Raposa ressurge como uma ponto de lazer rústico.
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