HOJE É
DIA DE...
ZÉ
PERIGOSO E A CHICOTADA NO TRASEIRO
(*) Nonato Reis
Da
perspectiva do homem, a mulher é o alvo preferencial ou mesmo exclusivo da
vida. Buscar o convívio com ela, cortejá-la e amá-la constitui a razão da
própria existência. Para o sexo oposto a mulher está no vértice de uma lei
natural, a da atração dos corpos, e como se sabe, as leis naturais são
imutáveis, posto que criadas por Deus.
Desde pequeno aprendemos que as coisas divinas
são imortais e eternas, ou seja: não têm começo nem fim. Assim, a partir da
introdução de Adão no Paraíso, o homem, em que pese as controvérsias, nasceu
para buscar a sua "costela subtraída” e com ela seguir até o infinito.
O diabo é quando de tanto gostar do "fruto
proibido" isso acaba por se tornar uma obsessão. Foi o que aconteceu com
Zé Perigoso, que eu conheci em um fórum eleitoral, tentando resolver uma
pendência no meu título de eleitor.
O cartório, em razão da iminência do termino do prazo para transferências, estava apinhado de gente. Aqui e ali surgia uma discussão, por tentativa de furar a fila, o que obrigava o segurança do local a intervir, já com o estresse nas alturas.
O cartório, em razão da iminência do termino do prazo para transferências, estava apinhado de gente. Aqui e ali surgia uma discussão, por tentativa de furar a fila, o que obrigava o segurança do local a intervir, já com o estresse nas alturas.
De repente irrompeu uma briga feia dentro do
salão e foi uma correria dos diabos, todo mundo tentando escapar para o meio da
rua pela única porta aberta ou pulando as janelas. Quebraram-se mesas, cadeiras
voavam de lado a outro que nem aviãozinho de papel.
A muito custo, alcancei o lado de fora,
descabelado, a camisa rasgada e o braço esquerdo sangrando. A briga, que havia
começado dentro do cartório, avançou para o meio da rua, onde dois homens
trocavam tapas e pontapés.
O segurança, depois de levar um soco perdido no
nariz, tentando apartar os valentões, sacou um “38” enferrujado e apertou o
gatilho duas vezes, a arma apontada para o alto.
Por instantes atordoados com o estampido das
balas, os lutadores se deram uma trégua, e "a turma do deixa disso"
entrou em ação, dando fim à confusão, porém sem evitar a troca de ofensas e
ameaças entre os dois. “Esse filho da puta mexeu com minha mulher”. “Mexi nada,
ela que me deu mole”.
Os
ânimos serenados, aproximei de Zé Perigoso e puxei. “Amigo, que furdunço foi
esse, você buliu mesmo com a dama?”. Zé me explicou que estava quieto na fila,
seu único intuito era corrigir imprecisões em seu documento eleitoral e voltar
para São Luís, onde trabalhava como fotógrafo profissional em um jornal.
De repente avistara aquele “rabo de saia” a
cruzar o salão, indo e voltando. “Era uma sereia maravilhosa. Eu olhei nos
olhos dela, ela olhou nos meus. Aí pensei comigo: morreu!”.
Zé
só não sabia que a sereia já tinha sócio no patrimônio. Aproximou-se dela e,
após os cumprimentos de praxe, partiu para o ataque, direto, objetivo, sem
meias palavras. Já fungava em seu cangote, tentando morder-lhe as orelhas,
quando o “dono do pedaço”, um motorista de ônibus, marrudo, surgiu do nada e
acertou-lhe um tabefe.
“Zé, mas isso não se faz! Como é que você
invade o domicílio do sujeito sem pedir licença?”. Zé deu uma risadinha e me
confidenciou que a culpa era mesmo dele. Não sabia lidar com o sexo oposto. Ou
melhor, não tinha controle sobre seus impulsos. “Mulher é o meu fraco. Se vejo
uma se balançar na minha frente, já fico com vontade de agarrar”. Porém, como a
atenuar suas faltas, explicou-me que nunca dava o primeiro passo. “Eu fico
observando o jeito dela. Se vejo que me dá mole, aí, meu amigo, eu vou pra
cima. Ninguém me segura”.
Por conta desse modo de agir desenfreado com as
mulheres, já passara por poucas e boas. Uma vez, andando pelo interior, pedira
hospedagem na casa de um quitandeiro, que de muito bom gosto dividira o seu
quarto conjugal, para que ele pudesse descansar à noite, após um dia
exaustivo.
A casa era pequenininha, só havia uma saleta,
um quarto e a cozinha. No primeiro cômodo, dormia o cunhado do quitandeiro. Na
cozinha, já ocupada com um fogão a lenha e um armário velho, não cabia ninguém.
O jeito foi armar uma rede para Zé ao lado da rede do proprietário da palhoça,
embaixo da qual ficava a cama da mulher.
Lá pela madrugada o barraqueiro foi despertado
com o ranger das grades da cama. Olhou para baixo e viu a bunda do hóspede
subindo e descendo sobre o corpo da esposa. Possesso, pegou uma ripa e botou Zé
para correr só de cuecas, debaixo de vara. De outra feita, engraçara-se pela
filha de um vaqueiro, que morava com o pai no lugar chamado Taberneiro, próximo
da Palmela.
Era tempo de inverno, os campos submersos. Só
podia chegar na casa de canoa. Durante uma “visita” à luz do dia, mentalizou os
espaços da casa; viu que a menina dormia na sala com o pai, numa rede perto do
corredor que dava acesso à cozinha. Esperou anoitecer. Combinara com a garota
para que deixasse a porta apenas encostada. De quatro entrou na casa e caminhou
pelo assoalho de gatinho. Por um descuido bateu na rede do velho, que ainda
estava acordado.
Imaginando tratar-se do vira-latas que
guarnecia a entrada da casa, o pai da garota pegou o chicote, que trazia
consigo na rede, deu um berro “cachorro!” e açoitou o traseiro do agressor que,
pego de surpreso e com a bunda latejando, berrou e começou a uivar que nem um
cão sarnento, até se jogar na rede da menina e se proteger com ela.
O velho acendeu a luz e, chicote em punho, saiu
à procura do cachorro pela casa, sem o encontrar. “Foi ele, eu o peguei pelo
rabo”, dizia o velho, na caça ao invasor. Temendo ser descoberta, a filha
tratou de encontrar uma saída. “Vai dormir, pai. Deixa o bichinho em paz, ele
está aqui comigo, gemendo de dor”.
(*) Nonato Reis é jornalista
e natural de Ibacazinho, município de Viana-MA.
Nenhum comentário:
Postar um comentário