quinta-feira, 13 de julho de 2017

A CRÔNICA DO DIA




HOJE É DIA DE... 

 
Nonato Reis
ZÉ PERIGOSO E A CHICOTADA NO TRASEIRO

(*) Nonato Reis

Da perspectiva do homem, a mulher é o alvo preferencial ou mesmo exclusivo da vida. Buscar o convívio com ela, cortejá-la e amá-la constitui a razão da própria existência. Para o sexo oposto a mulher está no vértice de uma lei natural, a da atração dos corpos, e como se sabe, as leis naturais são imutáveis, posto que criadas por Deus. 
Desde pequeno aprendemos que as coisas divinas são imortais e eternas, ou seja: não têm começo nem fim. Assim, a partir da introdução de Adão no Paraíso, o homem, em que pese as controvérsias, nasceu para buscar a sua "costela subtraída” e com ela seguir até o infinito.
O diabo é quando de tanto gostar do "fruto proibido" isso acaba por se tornar uma obsessão. Foi o que aconteceu com Zé Perigoso, que eu conheci em um fórum eleitoral, tentando resolver uma pendência no meu título de eleitor.
O cartório, em razão da iminência do termino do prazo para transferências, estava apinhado de gente. Aqui e ali surgia uma discussão, por tentativa de furar a fila, o que obrigava o segurança do local a intervir, já com o estresse nas alturas.
De repente irrompeu uma briga feia dentro do salão e foi uma correria dos diabos, todo mundo tentando escapar para o meio da rua pela única porta aberta ou pulando as janelas. Quebraram-se mesas, cadeiras voavam de lado a outro que nem aviãozinho de papel. 
A muito custo, alcancei o lado de fora, descabelado, a camisa rasgada e o braço esquerdo sangrando. A briga, que havia começado dentro do cartório, avançou para o meio da rua, onde dois homens trocavam tapas e pontapés.
O segurança, depois de levar um soco perdido no nariz, tentando apartar os valentões, sacou um “38” enferrujado e apertou o gatilho duas vezes, a arma apontada para o alto. 
Por instantes atordoados com o estampido das balas, os lutadores se deram uma trégua, e "a turma do deixa disso" entrou em ação, dando fim à confusão, porém sem evitar a troca de ofensas e ameaças entre os dois. “Esse filho da puta mexeu com minha mulher”. “Mexi nada, ela que me deu mole”.
Os ânimos serenados, aproximei de Zé Perigoso e puxei. “Amigo, que furdunço foi esse, você buliu mesmo com a dama?”. Zé me explicou que estava quieto na fila, seu único intuito era corrigir imprecisões em seu documento eleitoral e voltar para São Luís, onde trabalhava como fotógrafo profissional em um jornal. 
De repente avistara aquele “rabo de saia” a cruzar o salão, indo e voltando. “Era uma sereia maravilhosa. Eu olhei nos olhos dela, ela olhou nos meus. Aí pensei comigo: morreu!”.
Zé só não sabia que a sereia já tinha sócio no patrimônio. Aproximou-se dela e, após os cumprimentos de praxe, partiu para o ataque, direto, objetivo, sem meias palavras. Já fungava em seu cangote, tentando morder-lhe as orelhas, quando o “dono do pedaço”, um motorista de ônibus, marrudo, surgiu do nada e acertou-lhe um tabefe.
“Zé, mas isso não se faz! Como é que você invade o domicílio do sujeito sem pedir licença?”. Zé deu uma risadinha e me confidenciou que a culpa era mesmo dele. Não sabia lidar com o sexo oposto. Ou melhor, não tinha controle sobre seus impulsos. “Mulher é o meu fraco. Se vejo uma se balançar na minha frente, já fico com vontade de agarrar”. Porém, como a atenuar suas faltas, explicou-me que nunca dava o primeiro passo. “Eu fico observando o jeito dela. Se vejo que me dá mole, aí, meu amigo, eu vou pra cima. Ninguém me segura”.
Por conta desse modo de agir desenfreado com as mulheres, já passara por poucas e boas. Uma vez, andando pelo interior, pedira hospedagem na casa de um quitandeiro, que de muito bom gosto dividira o seu quarto conjugal, para que ele pudesse descansar à noite, após um dia exaustivo. 
A casa era pequenininha, só havia uma saleta, um quarto e a cozinha. No primeiro cômodo, dormia o cunhado do quitandeiro. Na cozinha, já ocupada com um fogão a lenha e um armário velho, não cabia ninguém. O jeito foi armar uma rede para Zé ao lado da rede do proprietário da palhoça, embaixo da qual ficava a cama da mulher.
Lá pela madrugada o barraqueiro foi despertado com o ranger das grades da cama. Olhou para baixo e viu a bunda do hóspede subindo e descendo sobre o corpo da esposa. Possesso, pegou uma ripa e botou Zé para correr só de cuecas, debaixo de vara. De outra feita, engraçara-se pela filha de um vaqueiro, que morava com o pai no lugar chamado Taberneiro, próximo da Palmela. 
Era tempo de inverno, os campos submersos. Só podia chegar na casa de canoa. Durante uma “visita” à luz do dia, mentalizou os espaços da casa; viu que a menina dormia na sala com o pai, numa rede perto do corredor que dava acesso à cozinha. Esperou anoitecer. Combinara com a garota para que deixasse a porta apenas encostada. De quatro entrou na casa e caminhou pelo assoalho de gatinho. Por um descuido bateu na rede do velho, que ainda estava acordado.
Imaginando tratar-se do vira-latas que guarnecia a entrada da casa, o pai da garota pegou o chicote, que trazia consigo na rede, deu um berro “cachorro!” e açoitou o traseiro do agressor que, pego de surpreso e com a bunda latejando, berrou e começou a uivar que nem um cão sarnento, até se jogar na rede da menina e se proteger com ela.
O velho acendeu a luz e, chicote em punho, saiu à procura do cachorro pela casa, sem o encontrar. “Foi ele, eu o peguei pelo rabo”, dizia o velho, na caça ao invasor. Temendo ser descoberta, a filha tratou de encontrar uma saída. “Vai dormir, pai. Deixa o bichinho em paz, ele está aqui comigo, gemendo de dor”.
 (*) Nonato Reis é jornalista e natural de Ibacazinho, município de Viana-MA.

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