terça-feira, 29 de dezembro de 2020

VÁ EM PAZ, JOSÉ BRÍGIDO!

 Por Marcondes Serra Ribeiro

Para além do artista, um homem exemplar, carismático, cidadão, filho, irmão, esposo, pai, amigo, com uma história de vida marcada pelos traços inconfundíveis do talento e amadurecimento com responsabilidade e temor a Deus!

É muito difícil juntar as palavras e expressar o sentimento, a comoção que me acometeu ao receber a notícia. Juntou-se à tristeza, alimentando-a e avultando-a, descontrolado e inevitavelmente, muitas lembranças de tantos momentos grandiosos e a certeza de que nossa cidade fica bem mais pobre em muitos aspectos, melancolicamente enlutada. José Brígido da Silva Neto chegou à maturidade, compondo uma história de vida pespontada por grandes realizações. Entristecido, confesso que perdi um ídolo com quem convivi e aplaudi ao vivo!

Assim que o conheci, uma das referências que lhe atribuíam era a participação em um concurso de talentos musicais na região: “A Voz de Ouro ABC”, onde ele teria se consagrado como um dos vencedores. Não precisei confirmar, porque sua voz, sempre bem tecnicamente impostada nas caprichadas e pessoalíssimas interpretações, dissipava qualquer dúvida. Assim, aproximados por ideias tão afinadas, tornamo-nos amigos, mas eu e todos nós que compúnhamos aquele seleto grupo de pessoas ligadas à música e à cultura, considerávamos-lhe  um ídolo.

Ouso garantir que nossos cantores se inspiravam e ainda se inspiram nele e colocando-o como referência, não só da cidade, mas do universo musical. Tivemos a oportunidade de comprovar seu talento teatral, quando encenamos  a peça “Episódio Árabe”, criação e direção de João Andrade, outro ícone de nossa época. Brígido protagonizou o anti-herói, simpático, fanfarrão, irreverente – uma lembrança de nossos tempos dourados, onde  tudo era muito disciplinado, respeitoso, trabalhado com dedicado talento natural.

Nenhum participante jamais esquecerá a mágica momesca a seu comando, quando “Os piratas” bailavam e cantavam alegremente coloridos: “Ponha uma arco-íris em sua moringa, é lucido é válido, inserido no contexto...” e aqueles momentos maravilhosos, aquele espírito de amizade e alegria, não apenas ficaram nos anais, mas também conosco, para sempre, como ele também permanecerá!

Reflito sobre a vida e suas nuances, as vitórias e derrotas, o mundo em constantes mudanças, a condição humana quase sempre angustiada, conflitante com a realidade;  as necessidades de adaptação aos ambientes e seus consequentes aprendizados; a vontade e o sonho esperançoso de construir algo belo e altruísta no torrão natal, atributos que fazem certas pessoas caminharem por uma distinta vereda, que depura a sensibilidade e aflora a  inspiração, culminando com a autoria poética, a criação artística, que compõe vidas com corações apaixonados e apaixonantes, caracteres generosos, almas grandiosas, ícones que se eternizarão entre nós!

Acredito que assim tenha acontecido com Brígido, um dos maiores expoentes de nossa geração, engrandecida por ele, com notáveis realizações artísticas. É uma perda significativa para todos nós, todos os amigos, pessoas dedicadas à arte e cultura. Perda para cidade e para a região. Ficamos mais sós e reduzidos, mais angustiados, especialmente nesse momento de apreensão e medo que nós vivemos. José Brígido transpõe a tênue linha da eternidade e deixa-nos o perpétuo legado de um grande artista, poderoso, insubstituível, máximo, modelar!

Brígido foi uma ser humano exemplar, sempre animado, positivo e cheio de energia, em todas as fases de sua vida, desde a juventude. Muito cortês, hospitaleiro, amigo e bem disposto às reflexões e conselhos, um experiente homem que recebia todos muito efusivamente, sempre sorrindo, aproveitando para fazer citações espirituosas.  Perdemos um grande cidadão, um artista especialmente múltiplo, cantor, compositor, ator, um homem dedicado e submisso aos ensinamentos do evangelho. Estamos perdendo uma figura da história de São João Batista e isso nos deixa profundamente consternados. É como se todos nós estivéssemos perdendo uma pessoa da família.

A morte de José Brígido da Silva Neto é uma perda irreparável para o universo artístico e cultural de São João Batista – celeiro de expressividades. Sem poupar reconhecimento, na verdade, é uma perda cultural da Baixada Maranhense e estadual. Junto-me aos amigos lamentosamente entristecidos pelo golpe fatal e registro minha solidariedade aos familiares e à sociedade joanina.  Sentimo-nos todos enlutados. Perdemos um artista eclético, múltiplo, que sem dúvidas deixará um vazio em nossa cidade. Nossas saudosas lembranças serão eternas e acontecerão de muitas formas, principalmente quando executarmos nosso hino, eternizador de sua maravilhosa e incomparável voz. Seu talento continuará nos inspirando e servindo de referência para as novas gerações!

Marcondes Serra Ribeiro é professor e autor do livro de poemas "Revérbero amarelo".

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

JOÃO DO VALE, O POETA DO POVO

Por Nonato Reis

 

Ainda menino, a pobreza grassando por todos os lados, ele negro e sem voz, sentiu o peso de carregar nas veias o sangue ancestral africano. Matriculara-se na escola em que o filho do rico também achou de estudar. Não havia mais vagas, alguém tinha que ceder o lugar. Sobrou para quem?

Completou 14 anos e viu que na sua Pedreiras, ou mesmo em São Luís, onde já estivera seguindo o eco de matracas e pandeirões, não havia futuro, só muros.

João Batista do Vale queria ser cantor e mostrar sua arte. A bordo de boleias de caminhão pegou estrada e saiu perambulando. Aportou em Fortaleza e escreveu carta ao pai, explicando por que deixara a terra natal, praticamente fugido. “Eu não tenho nada, mas sei fazer versos. Vou me tornar conhecido, ganhar dinheiro e ajudar a família”.

Chegou ao Rio dois anos depois, e além de escrever versos, só sabia carregar pedras e fazer massa de cimento. Foi trabalhar como ajudante de pedreiro nas construções de Copacabana. Era a época de ouro do rádio e dos programas de auditório. João sabia que ali estava o seu território. Queria ter suas músicas gravadas por Zé Gonzaga, umas das estrelas da época, mas foi com Marlene que ingressou no universo da música com “Estrela Miúda”.

 “Estrela miúda que alumeia o mar

Alumiar terra e mar

Pra meu bem vem me buscar

Há mais de mês que ela não

Que ela não vem me olhar

A garça perdeu a pena

Ao passar no igarapé

Eu também perdi meu lenço

Atrás de quem não me quer...”

João era um matuto sem instrução, mas tinha a musicalidade e sabia traduzir a alma do sertão, forjada na aridez do solo e na força do sentimento. Logo perceberam a beleza poética de seus versos que falavam tão bem ao coração e à consciência.

Conheceu Nara Leão e Zé Keti, nomes já consagrados da MPB. Nara era inconformada com a situação do País, então sob a égide do regime fardado. Keti, excelente letrista. João lia a realidade das ruas e do mato e as transformava em poesia. Foi como juntar a fome, o prato e o garfo.

Da parceria entre os três surgiu o show Opinião, que sacudiu a sonolenta Bossa Nova e deu um novo rosto à MPB. Na esteira do “Opinião”, João comporia músicas que iam do baião ao xote e até ao rock (as batidas de “Coronel Antônio Bento”, imortalizada na voz de Tim Maia, sugerem uma mistura de baião e de rock caipira). Até samba ele compôs. E qual seria o samba de João do Vale?

“Meu samba é a voz do povo

Se alguém gostou

Eu posso cantar de novo”

Essa música, na voz de Paulinho da Viola, fez um sucesso estrondoso, não apenas pela força melodiosa, mas por misturar com extrema leveza dois signos nem sempre harmônicos: poesia e protesto.

Protesto, que aparece nitidamente nesta sequência de versos:

“Eu fui pedir aumento ao patrão

Fui piorar minha situação

O meu nome foi pra lista

Na mesma hora

Dos que iam ser mandados embora”

E implícito neste jogo de metáforas:

“Eu sou a flor que o vento jogou no chão

Mas ficou um galho

Pra outra flor brotar

A minha flor o vento pode levar

Mas o meu perfume fica boiando no ar”.

Nara Leão era o grande nome do show Opinião, mas foram as músicas de João que entraram para a história. “Pisa na Fulô”, “Peba na Pimenta”, “Canto da Ema” “De Teresina a São Luís”. Nenhuma, porém, igual a “Carcará”, que junto com “Triste partida”, de Luiz Gonzaga/Patativa do Assaré, é considerada o hino do sertão.

Carcará, responsável por lançar Maria Bethânia ao estrelato, é uma música nitidamente sertaneja, que fala da crueza da seca e da resistência do homem, simbolizada na força da ave que dá nome à canção.

“Carcará, lá no sertão

É um bicho que avoa que nem avião

É um pássaro malvado

Tem o bico volteado que nem gavião”.

Certa vez perguntaram a João quantas músicas ele havia feito. “Mais de 400”, respondeu. Mesmo assim gravou pouco como cantor. Seu negócio era compor e entregar aos outros.

Conviveu com a nata da intelectualidade musical e dela granjeou respeito e admiração. Chico Buarque, Tom Jobim, Caetano, Gil, Bethânia... Chico, aliás, seu parceiro de muitas incursões, gravaria em 82 “João do Vale convida”, com participação de Nara Leão, Tom Jobim, Gonzaguinha e Elba Ramalho. O disco seria premiado como a melhor produção daquele ano.

João do Vale, considerado o maranhense do século, foi sem dúvida o artista local de maior prestígio no universo da música popular brasileira. Um talento que, mesmo sem o suporte das letras, delas fez a sua grande obra-prima e por elas se imortalizou. Como disse o jornalista Zuza Homem de Mello, “João do Vale não é antigo nem moderno, ele é eterno”.

 Nonato Reis é jornalista e escritor nascido em Viana-MA.

sábado, 12 de dezembro de 2020

Pelo bem da Educação...

 Por Marcondes Serra Ribeiro (*)


“Administrar é resolver problemas”, essa é uma definição óbvia e facilmente aceitável, mas concordo e aceito, bem mais satisfatoriamente, aquela que declara enfática e mais responsavelmente a questão de tão nobre responsabilidade à frente dos órgãos encarregados das políticas resolutivas dos problemas do povo: “Administrar bem é nunca acumular problemas”! Esta importante afirmativa deveria ser cumprida, ou, pelo menos, nortear o bom andamento da gestão pública, em atenção ao responsável compromisso de resolvê-los. Problemas sempre existirão, mas, considerando a situação de justificável impossibilidade em não conseguir resolver todos, torna-se até aceitável que o mínimo possível, dentre os prioritários, componha o “presente de grego” da gestão que finda, para a nova, recém-eleita e futura administração. Sabemos que obras importantes e muito necessárias foram realizadas!

Acredito que todo bom cidadão, amante de seu torrão, torça positivamente pelo seu desenvolvimento, preocupe-se com as questões mais agravadoras, comprometedoras do sempre lembrado e, na maioria das vezes, tão relaxado Bem Comum. Junto-me aos conterrâneos que se preocupam com todos os problemas, de forma especial, àqueles que influem diretamente sobre a educação, esportes e artes, porque são áreas de dedicada militância profissional e social há anos, que poderiam ter acrescido um pouco mais de melhorias e evolução nesses setores, se não tivessem sofrido a subestimação, os cerceamentos daqueles que poderiam apoiar, dar o necessário suporte, ou mesmo simplesmente liberar a execução. Faz-se mister lembrar o exercício d’alguns cargos exercidos no sistema por algumas pessoas comprovadamente eficientes, experientes, em diferentes mandatos – para mim, confessável sobrecarga do bornal das frustrações, onde a invídia alheia, principalmente dos ocupantes dos degraus acima, motivava a imposição da hierarquia e fechava o cerco, limitando-nos o espaço do quadradinho das atribuições, chegando ao malogro dos planos que sonhávamos realizar.

De verdade, nesta última oportunidade compondo o Corpo Técnico da SEMED, mesmo com toda limitação que a malgradada escala de poderes impunha-nos, por razões talvez até “justificáveis”, nossa modesta equipe conseguiu executar projetos excelentes, que deveriam ser realizados, pelo menos anualmente, como:

·         Jornadas Pedagógicas (2019, 2020) - com conteúdos oportunos e altamente válidos, voltados à melhoria do processo, ajustadas aos propósitos da BNCC;

·         Os Jogos Estudantis (2017) – indiscutivelmente um grandioso evento, além de um sonho meu de tantos anos, prazerosa e festiva culminância dos trabalhos escolares com as práticas desportivas, tão benéficas à educação;

·         Mostras Culturais (2017 e 2018) – oportunidades de enriquecimento da socialização e ampliação da bagagem cultural das crianças e dos adolescentes;

·         A Sacola Literária (2019) – projeto voltado ao incentivo à leitura, contendo livros paradidáticos escolhidos, para serem lidos em casa, pelos alunos e familiares;

·         Cânticos solenes dos hinos nas escolas (2017)– resgate do sentimento cívico, proposto para o início das atividades escolares, com hasteamento das bandeiras;

·         “Dia das Mães” (2017 – 2019)- incentivo e apoio à comemoração dos  sentimentos e virtudes” do incondicional amor materno;

·         O Encanto do Aprendizado Natalino (2018 e 2019)– uma proposta construtivista e expositiva sobre a cultura natalina, abrangendo a história de Jesus demonstrada através das artes mais destacadas no período, como a música, o teatro e o artesanato;

·         Incentivo à leitura (2018 e 2019)- projeto para contribuir com os alunos no desenvolvimento da criatividade, recontagem, a partir de seus pontos de vista, das histórias que chegaram até eles através dos livros paradidáticos  recomendados;.

·         Folclore Integrado (2019) – Trabalho elaborado carinhosamente, com uma metodologia construtivista, de abrangência multidisciplinar, proposto à U. I. “Raimundo Marques Figueiredo”, de Olinda, como prazerosa atividade recuperadora dos dias de paralização das aulas, por causa da reforma do prédio;

·         Projetos de Vida: Religando saberes, contextualizando o conhecimento (2017)– Ministrado pela UFMA, um projeto de construção de aprendizagens significativas para professores que atuam com alunos da educação básica, que não foi concluído, pelo descaso presencial dos professores da rede.


Alguns outros trabalhos, tão significativos e necessários, “goraram no papel”, sem o necessário apoio ou mesmo a autorização em empreender. Infelizmente!

Faz-se de bom alvitre esclarecer que os objetivos propostos pelo elenco referido, foram encaminhados às escolas e praticados de forma diminuta. Para muitos, a política partidária com requintes politiqueiros sobrepõe-se à política educacional. O quê tem sido uma tradicionalidade por demais lamentável!



 

De verdade, tivemos impedimentos para executar muitos bons projetos, justificáveis somente neste 2020, por causa dos cuidados preventivos com o surto pandêmico, como o distanciamento físico, uso de máscaras, zelo com a higiene das mãos - recomendação da lavagem com sabão e higienização com álcool em gel, que foram imposições protocolares consequentes da pandemia e isto se  tornou o álibi aceitável para muitas “impossibilidades” quanto ao trabalhos pedagógicos presenciais, conciliando, com justeza, as desculpas de tantos que costumeiramente faltam às suas responsabilidades. 

Muito, de tudo que se refere à melhoria do processo educacional, há anos, deve-se também ao despreparo, à ignorância e ao descaso de alguns gestores escolares, em todos os níveis, desconhecedores do processo pedagógico e dos preceitos da administração racional, eficiente e participativa – aqueles entraves bem costumeiros da gestão pública, que se tornaram maximizados pela situação nova e surpreendentemente difícil de ser contornada, consequente da Covid – 19.

Com o alarme pandêmico, ficamos num beco sem saída, sentindo-nos pressionados na busca de soluções. As aulas remotas, propostas inicialmente como solução mais eficaz, saída oportuna para amenizar a paralisação obrigatória das atividades tradicionais presencias, dependem do sistema mais moderno de comunicação, a Internet - Rede mundial de computadores conectados para interligar as pessoas,  que trocam dados e mensagens virtuais, onde os professores pudessem atender um planejamento estratégico de atuação com seus conteúdo, que obviamente depende, por parte de todos os componentes do processo, da posse ou aquisição de dispositivos (computador, smartphone, tablets etc), o acesso à Internet de qualidade, inclusive com a disponibilidade de créditos para essa finalidade, situação que expõe a discrepância  nacional que destaca nossa região por excelência - a terrível desigualdade social que nos impede em ativar a proposta, configurada como consenso entre todos os consultados na discussão do problema: Sindicato da classe, professores e técnicos da SEMED.

Reunimo-nos, conversamos, coletamos sugestões dos professores, discutimos com a entidade de classe dos professores, acompanhamos as propostas virtuais, analisamos as deliberações, enfim, buscamos alternativas que viabilizassem nossa situação e concluímos um Plano de Ação, onde as Atividades Impressas - as mais práticas e possíveis seriam executadas. Distribuímos os Livros Didáticos e jogamo-nos à produção dos conteúdos de cada ano escolar, em forma de kit, contendo os Cadernos de Atividades, Cartilha esclarecedora sobre a Covid, Carta aos pais/responsáveis e outros didáticos de apoio. Esse material foi disponibilizado às escolas   e hoje sabemos que grande parte não chegou aos alunos e do pouco que chegou, pequena parte teve acompanhamento.

Obviamente que o resultado não poderia ser outro - foi bem menor do que esperávamos. Muitas comunidades têm problemas quanto à mobilidade e no período da pandemia, o receio da contaminação afetou a todos e tudo se tornou bem mais difícil. Faltou-nos muito para conseguir efetivar as ações com as propostas experimentadas em outras localidades, que nos permitissem alcançar um contingente razoável de alunos. Fez-se muito pouco e isso foi excludente.

A constatação do insucesso das aulas remotas, trabalhadas apenas virtualmente, em razão das dificuldades comuns em muitas localidades brasileiras, fez surgir a proposta do ensino híbrido, que aplica uma  metodologia conciliativa entre o aprendizado conectado à Internet, com o tradicionalmente feito em sala de aula, em uma estrutura física, que acontece de forma presencial, valorizando a interação entre professores e alunos, obedecendo as necessárias exigências preventivas, quantitativo de alunos cumprindo o distanciamento protocolar, trabalhado por grupos reduzidos e alternados, buscando uma solução para a defasagem da proposta inicial totalmente conectada à Internet.

Mas o ensino híbrido, em qualquer uma de suas formas, requer também uma infraestrutura adequada, com professores treinados e isso já poderia estar sendo pensado desde agora, como parte de um planejamento contemplativo de um ano letivo que amenize as perdas deste 2020, que capenga arruinado rumo ao fechamento, com raríssimas exceções, visto que pouquíssimos professores  empenharam-se em fazer algo recomendado, como alternativa institucional, ou mesmo como fruto de suas pesquisas, graças ao responsável interesse por  ações educativas amenizadoras do problema neste período pandêmico.

O ensino híbrido desponta como uma alternativa que se manterá por algum tempo, considerando-se a previsível extensão dos cuidados preventivos com o covid-19, porque é um modelo que desenvolve o  protagonismo e a autonomia do estudante, levando-o a ser um sujeito participativo, construtor de conceitos e do próprio conhecimento; maximiza o aproveitamento das aulas e conteúdos; otimiza o tempo do professor; reduz os custos educacionais; aumenta o engajamento dos alunos e reduz a evasão; prepara mais eficientemente o aluno da Educação Básica, com vistas ao ingresso no Médio e permite a adequação de várias metodologias de aprendizagem.

Uma nova equipe será constituída e alerto que as dificuldades precisam ser claramente expostas, discutidas, para que a gestão educacional vindoura tenha reais condições de começar o trabalho voltado à superação dos problemas, à racional eficiência, conhecendo os maiores desafios da rede pública de ensino sob sua responsabilidade. Há grande necessidade de discussão das estratégias da educação municipal sobre os desafios estabelecidos pela pandemia do novo Coronavírus ao processo educativo. Pode parecer fácil, como forma vaidosamente simplória de demonstrar disposição e competência para encarar a responsabilidade com as ações resolutivas do problema, mas desfaço-me da modéstia e afirmo categoricamente que é “complicado” como costumava qualificar, todas as situações-problema, uma ex-gestora da educação joanina, cuja performance foi bem análoga à maioria antecessora e sucessora. E continuamos a marcar passo, ou retroceder, agora e por mais algum tempo, por força da pandemia. Não basta uma equipe composta de profissionais competentes. É necessário que todos que a compõem tenham competência, responsabilidade, disponibilidade, amor à educação e o secretário(a) tenha a confiabilidade do gestor e a liberdade de propositura, decisão e ação, comungadas com o Corpo Técnico da SEMED. Oxalá tudo aconteça satisfatoriamente!


Reafirmo que vejo apreensivo nosso caminhar para o fechamento de um ano letivo que transcorre sob a égide das preocupações preventivas com a COVID-19, e as consequentes dificuldades de aplicação de qualquer ação paliativa, que possa assegurar um mínimo de aprendizado. As perdas são incontestáveis, principalmente onde nada, ou quase nada, pode ser feito.  Seria óbvia, irrefutável a necessidade de prosseguir o bom trabalho desempenhado por uma equipe ao longo dos quatro anos de uma gestão, mas a pandemia, que infelizmente se prenuncia extensiva, chegou de chofre, surpreendeu o mundo despreparado para as radicais e necessárias mudanças no processo educacional e  nas regiões mais pobres, como a nossa, tudo ficou e continua bem mais difícil, as precariedades de diversas ordens sobrepõem-se às possíveis estratégias, mesmo aquelas que se mostram mais adequadas. Sobre a funcionalidade do ano letivo de 2020, o que será repassado para ter continuidade? É por demais necessário que isto seja discutido seriamente!

Não vejo a promoção massiva dos alunos como uma forma de sanar o problema do necessário e consequente atraso de um ano em suas escolaridades. Promover sem aprendizado não é correto. Deveriam analisar a possibilidade bem elaborada de excepcionalmente em 2021 os alunos cursarem dois anos simultaneamente, com definição de um currículo especial, com os assuntos realmente essenciais em cada campo de estudo. Há algum tempo, faço esta observação e indico-a como a alternativa mais eficiente para a recuperação deste nefasto ano que se aproxima do término.

Em quase todas nossas escolas, o mínimo aceitável ao processo do ensino-aprendizagem foi (?) trabalhado, aconteceu de forma limitada e, por ser tão ínfima, pouco acrescentou significativamente à aprendizagem dos alunos. Muito raramente se tem comprovação de professores que se esforçaram e superaram as dificuldades, mas que não atingiram toda classe, porque muitos alunos estavam impossibilitados em acompanhar os trabalhos, resultando assim em uma proposta lamentavelmente antidemocrática, porque não se faz democracia com exclusão, reafirmo!

Há quem conteste, por partidarismo politiqueiro, ou antipatias pessoais, mas fizemos “coisas boas” a nível pedagógico, antes da nefasta pandemia, trabalhos que poderiam repercutir bem mais amplamente, se entre nós, em nosso quadro professoral, as coisas da educação também não caminhassem atreladas à politicagem praticada por significativo número de profissionais. Mais um lamento que atrapalha o processo, desde muito tempo – desde sempre, como alguns reforçam enfaticamente!

Não apoio, não recomendo a ousada decisão de promoção ampla, geral e irrestrita dos estudantes e divago pensativo, analisando as propostas paliativas apresentadas para recuperação deste prejudicado ano escolar, sem concordar totalmente com nenhuma, sem que se monte uma estrutura que possibilite a boa aplicação do trabalho e exija-se seu cumprimento.  Precisamos de ensinamentos bem ministrados, motivados, e consequentes aprendizados, duo essencial ao processo e todo professor que considera essa relação e interessa-se, empenha-se para fazê-la acontecer, certamente afina com esta posição.

Acho que o ano letivo de 2021 deveria ser trabalhado com um projeto especialíssimo voltado à contemplação dessa realidade sumariamente defasada. Somos bem conscientes que os anteriores, transcorridos “normalmente”, sem contenções obrigatórias como esta que vivemos agora, encerravam-se com débitos de dias, de aulas, falta de cumprimento das obrigações escolares, registro das atividades no Diário de Classe, inúmeras faltas justificadas, além dos costumeiros  “faz de contas que ensino” promovidos por alguns, mas aconteceram, mesmo que carregados de precariedades. Este é que realmente não aconteceu para a quase totalidade dos alunos!

Há, dentre nossos profissionais, aqueles que agem eficientemente com as responsabilidades professorais, esmeram-se na efetivação dos projetos educativos propostos pela equipe técnica da SEMED e outros por eles planejados, que acontecem nas salas de aula, ou nos espaços improvisados das escolas, com atividades dinâmicas, interessantes, engrandecedoras do aprendizado, que só nos frustram pelo tempo exíguo concedido às suas práticas (desculpem-me pela silepse de pessoa. O orgulho inclui-me!). Sentimo-nos mesmo bem confortáveis, além das salas de aulas, nos espaços desportivos, para onde estendemos nossas atividades no apoio e na promoção dos esportes, ministrando treinos aos alunos, são espaços e tempo que ocupamos sem nenhuma dependência de qualquer autoridade, onde prevalece a índole do desportista, o amor pelas artes, a paixão confessa  pelas atividades professorais, a disposição às atitudes  motivadoras na transmissão de conteúdos em cada oportunidade, construindo com os alunos um caprichoso e rentável  labor  didático-pedagógico!

 


Quando nosso grupo de trabalho assumiu, em 2017, a SEMED - Secretaria Municipal de Educação, recebemos o pouco que foi deixado de forma desorganizada. Não houve equipe de transição, para efetuar a entrega dos registros e informações necessários ao começo de nosso trabalho, assim, ficamos desnorteados, cheios de novas ideias, mas sem saber por onde começar. Nós ficamos sem condições de atender o roteiro feito previamente e também sem poder dar continuidade a nada, porque foi premente a necessidade de reorganizar o pouco recebido e “correr atrás” de outras tantas informações documentais de suma importância. A mudança de prédio foi outro motivo para reorganizar, visto que nenhuma secretaria dispõe de espaço próprio e os aluguéis beneficiadores são exigências das promessas de campanha e precisam acontecer logo nos primeiros dias do novo mandato.

Precisávamos iniciar um novo ano letivo e estávamos ansiosos para começar com “pé direito”, mas foi trabalhoso, difícil de organizar tudo para o início decente das atividades sob novo comando.  Sequer encontramos listagem de professores e respectivas lotações. Precisamos busca-las no Setor de Pagamento, para situarmo-nos. Não houve a preocupação, da gestão anterior, em deixar a documentação organizada, para que pudéssemos dar continuidade aos trabalhos já realizados.

Todos os professores, gestores, coordenadores, supervisores que compõem um quadro educacional precisam agir conscientes de que as políticas educacionais não são de curto prazo e, portanto, precisam ter continuidade ao longo das sucessivas gestões para que sejam eficazes e neste processo, a documentação que constitui a memória da instituição educacional é de suma importância!

Por isso, é sumariamente necessário que não se deixe a organização da documentação constituinte do Memorial da Gestão para a última hora. Como estou afastado para tratamento de saúde, confio que nossa equipe esteja sendo orientada para organizar a documentação e a casa para entrega-las condignamente!

Não se pode dizer agora, ao avaliar nossa educação, que nestes anos todos, a culpa por sucessivos entraves, “marcação de passo”, retroação, estagnação sejam por fatores de força repressora equipolente à pandemia. Neste ano de 2020, sim, com certeza, mas, ao longo do tempo, nosso caminhar tem sido trôpego, lento, conduzido com certo descaso, uma observação que faço com mais propriedade, desde que me inseri no contexto da funcionalidade do sistema, testemunhando improbidades e cerceamentos. Bons profissionais nós temos, aqueles que se dedicam para que coisas boas aconteçam na educação – e têm acontecido, embora diminutamente, mas infelizmente temos testemunhado desatenções e descompromissos em considerável proporção!

 

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

CONVITES INDIVIDUAIS E PREFERENCIAIS

 Por Edomir Martins de Oliveira

Aquela placa comemorativa era o símbolo de uma nova inauguração que o prefeito do município estava registrando: - uma bomba que puxava água para distribuição do precioso líquido. - Agora teremos água em abundância, dizia o povo feliz. A solenidade contou logo com discursos de pessoas que não pouparam elogios ao político.

Mas a inauguração tinha outra finalidade prioritária. A bomba nova, na verdade, atenderia aos anseios do cerimonial que contratara para o casamento de sua filha a realizar-se na semana seguinte, que lhe informara ser sabedora da falta d´água no município, e que sem água seria impossível trabalhar, pois teria muita louça para lavar, copos, taças, talheres, pratos, panelas, e muito mais.

O prefeito, estrategicamente, marcou a inauguração da obra em data próxima ao casamento da filha, porque poderia realizar os festejos deste com verba pública, justificando que era festa de comemoração de um feito extraordinário para o município: a solução da escassez de água nas torneiras.

O pai explicou a sua filha, que fariam a festa em dois salões: o primeiro com decoração na cor champanhe, que seria o dos convidados das famílias de ambos os noivos, e convidados especiais. O outro, salão rosa, ficariam os seus eleitores fieis, alguns bem humildes, que eram potenciais multiplicadores de votos. E a campanha para a sua reeleição se iniciaria daí a um mês, portanto, pensava o prefeito, esse casamento era uma estratégia política das mais brilhantes.

Ela, a filha, sabia que quando envolvia política, os desejos do pai ficavam até mesmo acima dos da família. E, assim, se resignou e se preocupou com o casamento e tudo que envolvia os preparativos para o salão na cor champanhe. A organização da festa no salão rosa não seria responsabilidade dela. Iniciaram-se as entregas dos convites, acompanhados de um convite menor de identificação, para entrarem no salão de festas. Os convidados, comentavam pelo convite com que foram honrados, que a festa deveria ser um encantamento para ninguém colocar defeito. E logo, confessavam estar felizes por terem sido convidados para um evento tão importante.

Mais felizes ainda ficavam quando se detinham no cartãozinho que acompanhava o convite, confeccionados em duas cores, champanhe e rosa, que lhes garantia a entrada. Então, alguns convidados conversando entre si, observaram essa diferença em seus convites e surgiu a pergunta do porquê disso. Muitos diziam que, com certeza, os na cor champanhe eram para qualificar as pessoas que iriam fazer discurso. Estes foram logo preparando-os para não serem surpreendidos. Outros diziam que em champanhe eram os convidados do noivo e em rosa os da noiva.

Eis que chegou o dia da festa!!! Igreja lotada, Pastor inspiradíssimo e noivos felizes, marcaram um lindo casamento, muito embora o atraso da noiva tenha passado de uma hora.

Após a bela cerimônia, os convidados chegaram ao local da recepção, e logo começaram a ver que alguns eram dirigidos pelo cerimonial para um salão, e outros, para o outro.

Vários convidados do salão rosa começaram a estranhar porque a banda ficava no salão champanhe, bem como os noivos e suas famílias. Para o ambiente do salão rosa, o atendimento dos garçons se limitava a distribuição aos convidados de Chopp, com a espuma tomando conta de três quartos dos copos descartáveis, cidra, sucos e refrigerantes. No salão champanhe, eram servidas bebidas tais como uísque, vinho e prosecco, além de uma equipe de barman para drinques diferenciados.

No salão rosa, os salgadinhos ficavam em cima da mesa, isto é, frios e sem reposição, enquanto que no champanhe eram servidos canapés finíssimos e salgados quentinhos.

No salão champanhe, o jantar tinha ficado definido com pratos a base de filé mignon e camarão, enquanto que no salão rosa seria servido uma macarronada à bolonhesa e uma galinhada, duas opções bem fartas, segundo o prefeito.

Contando com os seus eleitores humildes e muito fieis, ele tinha certeza de que não se rebelariam. Afinal, já estavam felizes demais com a deferência de terem sido convidados. Fez questão, por pura gratidão, segundo ele, de colocar caixas de som no salão rosa para que pudesse chegar até os seus convidados o som da banda com nitidez.

O tranquilizava também o fato dos salões não se comunicarem e, dessa forma, eles não poderiam fazer comparações, pois não teriam acesso ao salão champanhe, haja vista que as portas só eram abertas quando algum convidado mostrava o seu convite diferenciado.


Mas eis que o principal líder comunitário da cidade procurou o prefeito, e insistiu muito para fazer um discurso de cumprimentos aos noivos, que representava a manifestação de apreço que toda a região tinha pelo prefeito e sua família. O político não esperava por isso. Como dizer não? Tentou dissuadir o querido parceiro político da ideia, sem sucesso, pois o discurso havia sio preparado com outros líderes. Na verdade, representava um discurso de toda a base política do prefeito.

E assim não teve jeito. O rapaz teria que fazer o seu discurso. O prefeito, então, explicou que só poderia ir ao outro salão o orador e que o som do seu discurso chegaria a todos pelas caixas; que ele o chamaria no momento certo.

O prefeito apressou-se em ir ao salão vip para ver o que poderia ajustar para que as diferenças tão gritantes de tratamento pudessem ser minimizadas durante o discurso.

Os noivos não queriam ouvir discurso algum.  A noiva disse ao pai que isso seria muito constrangedor, mas para o pai a política sempre estava em primeiro lugar.

Eis que chega super animado o orador, conduzido pelo prefeito. A banda parou de tocar para o momento, mas os copos de drinks sobre as mesas, bem como as delícias servidas, não puderam ser removidos. Do palco, o orador sentiu também a decoração, a quantidade de garçons e tudo mais. Ficou muito decepcionado com a gritante diferença de tratamento. Era por isso que havia duas cores de convites.

O prefeito fez um preâmbulo apresentando o orador, passando-lhe a palavra. Fez questão de ficar ao seu lado no palco, pois queria usufruir de todas as honras. Enquanto o político falava, o orador observava tudo que acontecia no salão. Este era conhecido por ter o dom da oratória.

Iniciou a sua fala, sem puxar nenhum papel, e abriu o seu coração em um marcante discurso, parabenizando os noivos. Falou que a sua voz representava a de todos os demais convidados do salão rosa, que assim como ele ficaram super felizes pela deferência do convite. E o prefeito foi ficando todo feliz. Porém, o tom foi mudando, e o orador foi falando da sua decepção em detectar daquele palco que os convidados tinham tratamentos desiguais.

 Falou que os convites de cor rosa eram para aqueles de condição social desfavorecida e melhor seria que nenhum deles houvesse sido convidado. E por aí continuou, em um discurso improvisado, dizendo da sua decepção, enquanto o prefeito ia suando, ficando pálido, abaixando a cabeça, - "aqui estamos sendo tratados, neste casamento, como desiguais, porém, lembre-se, Prefeito, todos somos iguais perante as urnas, de onde sempre vem a resposta de insatisfação. Prefeito, reflita sobre o que diz a Bíblia em Tiago 2:9 – “Se, todavia, fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado, sendo arguido pela lei como transgressores”. – “Corta o som, disse o Prefeito aos gritos. O orador terminou seu discurso”. Quando o líder voltou ao seu salão, foi aplaudido de pé pelos presentes, e os convidou a se retirarem ante aquela humilhante situação. Mas, nem todos o acompanharam, estavam esperando a galinhada e a macarronada à bolonhesa que seriam servidas. Não iam sair com fome.

A notícia de como transcorreu o casamento se espalhou. Consequentemente, o prefeito em baixa, não se reelegeu. E o orador? Quatro anos depois se candidatou à prefeitura, concorrendo com o ex-prefeito do casamento e mais quatro candidatos. Ganhou a eleição! Fez uma brilhante carreira política, se tornando um combativo e respeitado senador da República, sempre lutando pelos menos favorecidos.