sábado, 7 de setembro de 2019

A propósito da música “Eu te amo, meu Brasil”


A música de autoria de Dom da dupla Dom e Ravel, a contrário de que muitos pensam não foi uma composição encomendada pelo regime militar, na pessoa do Presidente da República à época Emílio Garrastazu Médice.

Ainda que usada pelo governo em suas propagandas como forma de exaltar o civismo e o sentimento ufanista, a música fora composta e gravada em 1970 pela Banda “Os Incríveis” por conta do clima da Copa de 70, e que dada a sua execução e sucesso chegou a ser mais popular do que a música oficial da competição “Pra frente Brasil”, de Miguel Gustavo.

Na época do lançamento o governo fazia uma forte propaganda nacionalista, que ia muito além dos slogans “Brasil, ame-o ou deixe-o”. A paixão e a expectativa pelo tricampeonato da Copa de 1970 eram usadas como forte apelo à aprovação do novo regime autoritário. Também acontecia uma guerra ideológica dentro da indústria fonográfica. A maioria dos artistas intelectualizados, como Chico BuarqueCaetano VelosoGilberto Gil e Milton Nascimento eram opositores ao militarismo, e escreviam letras politizadas como forma de protesto.

Foi dessa treta entre os artistas da música brasileira que se dividiram entre os que eram contra o regime militar e faziam sutis letras politizadas contra a ditadura militar, a exemplo da música de Sérgio Sampaio, “Eu quero é botar meu bloco na rua”, ou mesmo a música “Calice” composição de Chico Buarque e Gilberto Gil, além da lendária “Pra não dizer que não falei das flores” de Geraldo Vandré, e os que ficaram impassíveis a esta luta e que por isso foram chamados de “adesistas”, mesmo sem nenhuma relação direta com o governo dos militares.

Havia portanto um mal-estar entre aqueles que não se posicionavam contra o governo, que eram tidos como “alienados”, como alguns dos astros da Jovem Guarda. Na esteira dessas ditas “injustiças” muitos artistas tiveram suas carreiras sacrificadas, como foi o caso de Wilson Simonal, que teve sua vida artística literalmente arruinada.

Don, um dos compositores da música ao lado de seu irmão Ravel, afirmou que a letra só buscava exaltar as belezas naturais do Brasil e de seu povo e que visava contrapor o sentimento nativista e nacional ao consumismo de coisas e modismos norte-americanos. Apesar do grande sucesso entre o público em geral, os irmãos não agradavam a esquerda do país, de políticos a artistas.

Eustáquio e Eduardo Gomes de Farias, ou melhor, Dom e Ravel chegaram em São Paulo ainda crianças, nos anos 50, vindos da pequena cidade de Itaiçaba, no Ceará. Já no final da década seguinte, tentaram uma carreira no disco e lançaram o LP Terra Boa, que trouxe o primeiro grande sucesso deles, a música Você Também é Responsável”, que acabou sendo usada dois anos depois como uma espécie de hino ao recém criado Mobral – Movimento Brasileiro de Alfabetização – órgão criado no governo militar para melhorar o nível de alfabetização no país que buscava ser uma nação desenvolvida.

O fato, no entanto, não foi visto com bons olhos pela comunidade artística, que acabou taxando os irmãos de puxas-saco do governo militar, o que se agravava ainda mais com as novas composições da dupla, a maioria enaltecendo o Brasil, coisa que agradava muito aos militares do governo. São dessa fase os sucessos Obrigado ao Homem do Campo”, “Só o Amor Constrói, e principalmente “Eu Te Amo, Meu Brasil, composta pela dupla e gravada pelo conjunto Os Incríveis.

Como se vê, ainda que o ufanismo brotasse das letras das músicas de Dom e Ravel, suas composições nada tinham de intencional ou conluio com o governo dos militares. Mesmo assim, a dupla sofreu das injúrias da elite cultural e amargou o ostracismo a partir de então até o fim de suas vidas, restando então, a errônea concepção de que suas composições são mensagens da ditadura militar . Nada a ver.

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