domingo, 15 de abril de 2018

A CRÔNICA DO DIA


HOJE É DIA DE...  

ZEFA E O CHÁ DE PENTELHOS
(*) Nonato Reis

Imagem ilustrativa
Zefa Mata Virgem fez fama nas terras do Ibacazinho e redondezas, não por ato de heroísmo ou qualquer coisa de que se orgulhasse e muito menos aos donos da fazenda Caiçara, de cujos filhos servira como ama de leite. Chegara na Palmela aos 13 anos, egressa do Juncal. Ali conheceu o antigo proprietário do lugar, Antônio Feliciano de Mendonça, pai de 14 filhos, entre os quais Mariano (Nhonhô), Macico, Sálvio, Deia, Bidi e Áureo.
A fazenda Caiçara fazia fronteira com a Palmela e Zefa interagia com seus moradores como se fossem a extensão de sua própria família. Gostava da vida simples do mato, cheia de atrativos, cercada de animais e plantas, na companhia daquela gente.
Acordava às 4 da manhã, para ajudar na ordenha do leite, a ser vendido em Viana. O transporte do produto no inverno era feito em canoas, e no verão, em boi cavalo e carro de bois, a partir de um ponto de apoio com palhoça e curral, construído à beira do Igarapé do Engenho. Zefa amarrava os animais a serem ordenhados e ao final da operação era premiada com uma porção espumosa do leite mugido, que tomava junto com Sálvio e seus irmãos menores.
Crescera naquele ambiente rústico e de encantamento. Atingira a juventude e, como toda mulher nessa idade, namorou e apaixonou-se. Perdeu a virgindade com um peão boiadeiro que cruzara a Palmela de passagem, num acontecimento que marcou a vida do lugar, e muito mais a de Zefa, que a partir de então ficaria conhecida com o acréscimo no nome de "Mata Virgem".
É que nessa época de pouca instrução e hábitos rudimentares a palavra “depilação” ainda não entrara no vocabulário das localidades do interior e os pelos pubianos de Zefa cresciam livremente e se entrelaçavam à semelhança de um cipoal que, praticamente, impediam a penetração de qualquer invasor.
O peão, que levou uma parte de culpa na história por falta de habilidade com a coisa, entrou errado na intimidade de Zefa e se deu mal.
O órgão sexual ficou completamente retalhado, como se cortado de gilete em todas as direções. A situação saiu do controle dos dois porque o pênis infeccionou e ele precisou ser levado às pressas para atendimento médico em Viana. A história correu mundo e Zefa, para sempre, seria lembrada com a alcunha de “Mata Virgem”.
Ocorre que o tempo é o melhor remédio para toda e qualquer ferida. Um dia Ambrósio, vaqueiro criado na fazenda Caiçara junto com Zefa como se fora filho dos patrões, engraçou-se dela e, alheio aos apelos e advertências dos mais velhos, subiu ao altar com Zefa Mata Virgem.
Foi uma festança danada, os donos da fazenda patrocinaram tudo: mataram bois, contrataram violeiros, prepararam a igreja que ficou uma beleza. Trouxeram até um sanfoneiro afamado das bandas de Exu, no Estado de Pernambuco. Os “comes e bebes” duraram dois dias, ao cabo do qual os noivos receberam de presente uma casinha nos fundos da fazenda, construída especialmente para eles.
Imagem ilustrativa
O começo da vida conjugal foi um mar de rosas, Zefa não tinha do que se queixar. O marido era habilidoso, sabia como penetrar a selva protuberante, cobria-a de mimo e de sexo, que faziam em sessões diárias, ao raiar da aurora e ao morrer do sol. Ocorre que passada a euforia, o mar perdeu água e virou córrego. Cada vez mais envolvido na labuta da fazenda, Ambrósio foi se distanciando do ambiente doméstico e dos afazeres conjugais, até que perdeu o apetite pela coisa completamente.
Atônita e certa de que o parceiro “virara o miolo” por alguma sirigaita das redondezas, Zefa Mata Virgem procurou Cristina, uma curandeira respeitada por dar vida a um enfermo desenganado do “Velho Trancoso”, e contratou-lhe os serviços.
Após tomar pé do problema, a curandeira recomendou-lhe preparar uma infusão de pentelhos e mel de abelha e dar ao marido, porém com uma advertência. “Não pode exagerar na dose. São apenas alguns pelos entrelaçados, cozidos e coados e uma colher de mel". Zefa já abria a porta e ela completou. “Bastam dois dedinhos e ele volta a brincar na selva”.
Eufórica, Zefa pegou uma tesoura e devastou metade da cabeleira pélvica. Pôs a maçaroca numa panela com um copo ao meio de mel e, por sua conta e risco, adicionou uma pimenta malagueta. Depois de fervido fez o marido beber.
No dia seguinte Ambrósio era um homem à beira da morte, de tanto vomitar por cima e por baixo. Aflita, Zefa correu à casa da curandeira e a responsabilizou pela ocorrência. “Meu marido está morrendo e a culpa é sua”.
Cristina quis saber como ela preparara a beberagem. Ela explicou que caprichara na retirada dos pentelhos e depois levantou a saia, sem calcinha, para comprovar o resultado da capina. Estupefata com o cenário, Cristina levou a mão à boca. “Pela madrugada! Tu mataste o teu homem! Eu te mandei retirar alguns pezinhos de vassoura. Não mandei devastar o matagal!”.
(*) Nonato Reis é jornalista, poeta, cronista e  romancista. É autor do romance "Lipe e Juliana". Lançará em breve o livro de crônicas "Fazenda Bacazinho".

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