Por José Sarney
O imortal José Sarney |
O Padre Vieira afirmava que o Diabo era o dono do
mundo.
Para isso invocava as palavras do próprio Cristo,
quando foi tentado por ele no deserto da Judeia, depois de batizado por João
Batista e ter jejuado durante quarenta dias. O “maligno” como se dizia nos
tempos antigos, para nem pronunciar o seu nome, teve a ousadia de leva-lo às
alturas e de lá mostrar-lhe todos os reinos do mundo e dizer-lhe: “Tudo isso
será teu, se me adorares.” Diz Vieira que, se o Diabo lhe disse isso, é porque
o mundo é dele, senão não o ofereceria ao Senhor.
Com o desenvolvimento da humanidade, da ciência e
do pensamento, o homem não conseguiu matar a Deus, mas o Diabo foi morto e
desapareceu. Na minha infância eu ainda tinha medo do Diabo. Mas ele
desaparecera.
Não é que agora, depois de ver as atrocidades
inimagináveis que estão acontecendo, não encontro justificativa para nada e sou
levado a temer o Diabo da minha infância e a constatar que ele voltou.
Ele está agora entrando na cabeça do homem.
Não mais o homem primitivo, o cro-magnon, que
matava sem saber a quem matava, dizimava seus irmãos e mulheres dominado pela
violência do instinto da sobrevivência; mas o homem moderno, este que foi à
Lua, desvenda os ínfimos mistérios de divisão dos genomas, quem mostra uma
cabeça tão primitiva quando a dos neandertais, quem pensa e programa a morte de
crianças, tocando fogo nelas, numa creche de Janaúba e em si mesmo.
Nada mais puro e humano do que uma creche — nome de
origem francesa que significa o presépio do Menino Jesus —, que recebe crianças
enquanto as mães trabalham e afastam-se por algumas horas do dia do seu amor em
busca de sustento, e onde aprendem, brincando, a se relacionar umas com as
outras, na beleza da inocência. De repente são atingidas por inflamáveis de um
louco ou alucinado que as incendeia. Quase vou as lágrimas quando ouvi de uma
sobrevivente de quatro anos, quando perguntada por seu nome, a resposta
apavorada: Fogo!
Não culpemos nosso País, como hoje está moda fazer,
como se só aqui acontecesse coisas impossíveis. Vejamos um país rico, líder
mundial, esbanjando consumo. Jovens, no desfrute da alegria, no gosto da vida,
em busca da felicidade estimulada pelos sons das músicas de que gostam, da
dança libertando o corpo de suas posturas naturais, em pleno êxtase, numa
cidade de luzes e brilhos, cores e maravilhas, são surpreendidas pela morte
trazida por outro alucinado, que planeja tudo e, durante dias, leva calmamente
malas de armas ao quarto de um hotel, no 32º andar e de lá começa a matá-los,
acabando com suas vidas que começam e sepultando todos os seus sonhos.
É impossível aceitar que isso acontece como obra do
homem, por maldade, crueldade ou possessão.
Só tenho para impedir minhas lágrimas, uma
explicação: é o Diabo, o mesmo Diabo que tentou Cristo e que está aí.
E, para desgraça nossa, o Senhor Trump defende mais
armas! Valha-nos Deus.
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